Em 14 de dezembro de 1960, o Presidente Juscelino Kubitschek, no alto da escadaria que dá acesso ao Palácio das Esmeraldas, na Praça Cívica, assinou, diante da multidão, a Lei n.º 3.843 C que criava a Universidade Federal de Goiás.
Se a luta pela criação da UFG foi a luta de muitos, podemos até afirmar, que todo o povo goiano – governo, estudantes, intelectuais – a luta para criar a Faculdade de Filosofia foi de um homem – o Prof. Colemar Natal e Silva, primeiro Reitor da Universidade. Idealista de visão dinâmica e clara dos problemas universitários, sentiu que faltava à Universidade aquele princípio unificador, um núcleo central em torno do qual gravitassem as atividades universitárias sem o qual a Universidade continuaria a ser um agregado de faculdades estanques.
A criação dessa unidade era um imperativo da própria Lei n.º 3.834 C, que dispunha em seu Art. 2.º, § 3.º que o Poder Executivo devia promover, dentro do prazo de 3 anos, a criação ou agregado à Universidade de uma Faculdade de Filosofa, Ciências e Letras.
Pode parecer, hoje, estranho que a Lei, ao criar uma Universidade, se preocupasse com a falta de uma simples unidade. Convém lembrar que as Universidades só poderiam ser criadas se tivessem as Faculdades de Direito e de Filosofia, Ciências e Letras. As outras eram optativas, só as duas obrigatórias. O parágrafo enxertado no texto da Lei servia para legalizar a criação da nova Universidade, tendo em vista que a Faculdade de Filosofia iria ser criada no prazo de 3 anos, o legislador fez de conta que ela já existisse. Na prática, o jeitinho se revelou inoperante – o simples fato de torná-la imperativo da Lei não a criava e muito menos a punha em funcionamento.
O Brasil debatia-se, como ainda hoje, em crise financeira; não havia verbas sobretudo para a educação, como sempre. O parlamentarismo que se instalara à época, no país, após a renúncia de Jânio Quadros, transformou as soluções dos problemas num autêntico jogo de empurra entre o Executivo e o Legislativo.
Coube ao Poder Executivo, em 08 de novembro de 1962, baixar o Decreto n.º 51.582, firmado por João Goulart, Hermes Lima e Darcy Ribeiro, respectivamente, Presidente, Primeiro Ministro e Ministro da Educação, criando a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Federal de Goiás.
Mas, entre a data da criação da Universidade – 14 de dezembro de 1960 – e a da criação da Faculdade de Filosofia – 08 de novembro de 1962 – inúmeras lutas foram travadas. Todos na Universidade e no MEC estavam, aparentemente, de acordo, nos altos e baixos escalões, mas o processo já pronto desaparecia nos labirintos ministeriais; uma vez chegou até o Ministro só com a capa, esvaziado que fora de todos os documentos.
A luta não era em campo aberto, mas entre os bastidores, contra inimigos fantasmas. Os inimigos da Faculdade eram nitidamente divididos em dois campos – os que afirmavam que, embora necessária legalmente, podia-se muito bem passar sem ela e os outros que a queriam tão perfeita que a tornavam impossível.
Eram as Faculdades de Filosofia, seja sob o modelo da USP ou como o dos Institutos Centrais de Brasília, verdadeiros focos de fermentação social contra o tradicionalismo e a estagnação. Isto, talvez, faça compreender o porquê de tanta celeuma.
O Magnífico Reitor, Dr. Colemar Natal e Silva, cansado de tantas promessas e delongas, resolveu avançar o sinal, amparado pelo artigo 122 do Estatuto da Universidade, que permitia a criação e o funcionamento de cursos próprios da Faculdade de Filosofia, provisoriamente, em outras unidades.
Na sessão ordinária de 25 de setembro de 1962, o Conselho Universitário permitiu o funcionamento da Faculdade, antes mesmo do Decreto de criação, da competência do Presidente da República.
Guardo em meu arquivo particular o inteiro teor daquela corajosa reunião que não só aprova como define a nova Faculdade – força unificadora do ensino básico da Universidade e não agência incolor de diplomação.
Após a resolução de 25 de setembro de 1962, o Magnífico Reitor Colemar Natal e Silva tomou imediatamente as medidas preliminares para tornar efetiva a criação.
Foram convidados alguns professores para, provisoriamente, até à época do concurso, trabalharem na estrutura da nova Faculdade e, ao mesmo tempo, foi constituída uma Comissão composta pelos Professores Egídio Turchi, Orlando de Castro e Floracy Amaral Rebouças, para divulgar o acontecimento, tendo em vista os próximos exames vestibulares. Coube ao Prof. Genesco Ferreira Bretas a tarefa de preparar o Regimento da Nova Faculdade.
Percorremos os colégios de Goiânia e, após alguns dias de intensa propaganda, começamos cursos preparatórios par aos exames vestibulares da nova Faculdade no Instituto França à Rua 29 – Centro.
A reação foi mais violenta do que era lógico esperar, o próprio Conselho Universitário se assustou diante das críticas generalizadas. Publicou-se nos jornais que não havia verbas para a abertura de novos cursos, que não era esta a forma de criar uma nova Faculdade, que não sendo legal, seus diplomas não teriam valor e os alunos perderiam seu tempo. E eis que, no dia 14 de novembro de 1962, o Diário Oficial da União publicou o Decreto de criação da nova Faculdade. Reuniram-se no Gabinete do Magnífico Reitor os professores Egídio Turchi, Atico Frota Vilas Boas da Mota, Gilberto Mendonça Teles, Genesco Ferreira Bretas, Celenita Amaral Turchi, Genesy de Castro e Silva, Moema de Castro e Silva Olival, Floracy Amaral Rebouças e o futuro Secretário Sérgio Dias Guimarães. Foi a primeira reunião de professores da Faculdade de Filosofia.
Se a resolução de 25 de setembro do Conselho Universitário foi o primeiro passo, se o Decreto de 08 de novembro deu-lhe sanção legal, aquela reunião representou, para nós, o momento em que a Faculdade começou a existir de fato. À noite, com os alunos do Curso Preparatório em funcionamento há mais de um mês, houve uma grande festa de comemoração e regozijo.
No dia 14 de novembro, nos primeiros anos, era festejado solenemente o aniversário da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFG.
Em 17 de dezembro de 1962, foram realizados os exames vestibulares e, em fevereiro de 1963, a 2.ª época.
Inicialmente, funcionaram apenas 4 cursos: Letras, Pedagogia, Matemática e Física. As aulas começaram no dia 04 de março de 1963. A administração, no primeiro ano, era assim constituídas:
Diretor – Egídio Turchi
Vice-Diretor – Atico Frota Vilas Boas da Mota
Primeiro Secretário – Sérgio Dias Guimarães
Primeira e única funcionária durante o ano de 1963 – Maria Amélia Silva.
Corpo Docente da Faculdade de Filosofia no primeiro ano de funcionamento:
Letras:
Ático Frota Vilas Boas da Mota – Espanhol
Celenita Amaral Turchi – Italiano
Egídio Turchi – Latim
Genesy de Castro e Silva – Literatura Francesa
Gilberto Mendonça Teles – Literatura Brasileira
Gudrum Rademacher – Alemão
Helena Mascarenhas Falluh – Inglês
Pe. José Pereira de Maria – Cultura Brasileira
Louvercy Olival – Lingüística
Maria França Gonçalves – Gramática Francesa
Maria Helena de Souza – Inglês
Mário Carmo da Costa – Inglês
Moema de Castro e Silva Olival – Língua e Filologia Portuguesa
Neide de Faria – Francês Prático
Robinete Sant’Ana – Inglês
Waldir Luís Costa – Literatura Portuguesa
Depoimento publicado na Letras em Revista do Instituto de Ciências Humanas e Letras/UFG, v. 1 n.1/2 jan./jun. 1990.